de dedo de poeta a olho de poeta

Amanhã embarco mais uma vez para Nova York. Há muito tempo, num vôo para Adis, capital da Etiópia, me sentei ao lado de uma mulher linda, que naquela sabedoria dura e amorosa de emigrante que me disse:

“Se for à Nova York, saiba exatamente o que faz por lá. Senão, você se perde”.

Desde que escutei este conselho, o levo muito a sério. Na primeira vez em que fui, já sabia o que queria: entender da cena cervejeira. Visitei muitos e muitos bares, pequenas lojas, empórios, cervejaria. Conheci gente ótima, estações de metrô, aplicativos para celular, mapas. Foi uma grande rodada cheia de outras rodadas. Rendeu uma matéria para a revista Have a Nice Beer: De bar em bar – um guia para cervejas artesanais em Nova York (nov. 2014, p. 27).

Na segunda vez, só queria descansar e amar. E curtir o frio. Bem, tilintei. Era inverno. Pesado. Rolou o tal “zero graus Fahrenheit” e lembrei o quanto me pareço com a bromélia da estufa com minha alma de animal tropical. Não consegui quase sair. Li muitos livros. Tomei banho de banheira, algo impensável na São Paulo sem água. Roubei histórias das pessoas. Comprei meias e um gorro. Fiquei observando a neve caindo à noite, como se viesse do espaço sideral, e me lembrando de como acho isso tão bonito. E bobo. Foi bom.

Agora, nesta terceira vez, o plano é conhecer outros escritores e poetas. Escrevi para amigos de amigos de amigos. Esta rede invisível e tão poderosa que é ser poeta. Uma grande chave. Funciona em Maputo. Em Santiago. Em México DF. Até em São Paulo, na cidade sem amor. Esta grande chave interpretativa de cidades, seus habitantes. Uma chave para se fazer amigos.

Não tinha tomado este passo antes pelo cansaço do fim do doutorado e por insegurança mesmo, uma cidade tão grande e tão cheia de atividades como Nova York, pessoas sempre apressadas, sempre com respostas na língua. Como se soubessem exatamente o que querem. Como se soubessem o que fazem. Agora, estou mais animada. Com saudades de ir no Jimmy’s no. 43, no Proletariat, de ver o Sock-man-ele-mesmo xingando os clientes que querem trocar meias. Vou ver se dá tempo de levar um punhado de poemas comigo. Essa desculpa esfarrapada.

Começou. Contarei.

 

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