Exercício nº 5: traduções impossíveis

Dia dos namorados em 2015 no Brasil. Hoje e agora. E pensar que a noção do amor que conhecemos não existe e não existiu para tantas civilizações. Arrisco mais, dizendo que o denomino de “amor” não é o mesmo “amor” dos meus pais. Mais diferente ainda de meus avós. Como seria o “amor” de meus bisavós? Em outros países, o “dia dos namorados” possui outra acepção. O amor pode englobar amigues. Pode ser em outra data. Happy valentine’s day.

Traduzir é um ato relevante a quem escreve. Seja tradução no sentido estrito (dizer o sentido de uma palavra em outro idioma), seja no sentido conotativo de explicar um sentido menos habitual, captar e reelaborar em palavras uma cena, uma emoção. Traduzir textos e cenas que gostamos é excelente para afiar as facas da criatividade e espiar dentro dos profundos fossos de fundação dos edifícios de sentido.

Também gostaria de complicar dizendo que sinônimos absolutos não existem. Claro! É quase uma questão de lógica: se uma palavra fosse exatamente idêntica a outra, esta segunda palavra seria extinta pela total inutilidade. Percebe?

Sempre há um “algo” diferente entre uma palavra e outra. Digo, dentro um mesmo idioma mesmo. Quando linguísticas fazem o que se denomina “estudo de campo semântico” é isso: vc contrasta sentidos e anota o que há de diferente. No exemplo dos sinônimos progenitora, mãe e mamãe, é possível perceber o fenômeno – o sentido se altera, saindo de uma palavra bem burocrática e, às vezes, religiosa (progenitora), avança para um sentido mais habitual, que pode ter muitos usos e discursos (mãe) e caminha para à linguagem infantil, o recôndito doméstico, etc (mamãe). Ou seja, esses sinônimos, se forem analisados à contrapelo, não são palavras com o sentido idêntico. Ahá. Te contaram isso na escola?
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Hoje a ideia é praticarmos traduções impossíveis.

Sim, a ideia de fracasso é inerente. Não, não vai dar certo. Mas o que se ganha no caminho do fracasso é maravilhoso. A ver que pasa.

Fiz duas variações de exercícios que lidam com o tema. Se joga.

 

Proposta 1

[1] Escolha uma palavra ou expressão que vc considere bastante difícil de tradução. Algo que te emocione, que vc ache importante, que faça sentido escrever a respeito. Pode ser em outro idioma, pode ser uma variação linguística, pode ser uma sensação, comportamento. Selecionei três exemplos, um literário e outros dois mais cotidianos:

  • Em outro idioma: leia o lindo texto da Nessa sobre o que significa a palavra lagom em sueco.
  • Em uma variação linguística: veja aqui o que é uma perigótica.
  • Um comportamento: shippar um casal
  • (Lembrei ainda do afliceta da Tarsila, mas não achei o vídeo da mina falando dessas afliçõezinhas)

[2] Escolheu? Agora tente traduzir. Com tuas próprias palavras. Não tem problema se vc fizer textão. O que importa é vc tentar trazer um sentido alienígena ao próprio seu-mundo.

 

Proposta 2

[1] Selecione o verso mais lindo do mundo cantando em outro idioma. Tipo o happiness hit her like a train on a track.

[2] Traga pra sua própria língua.

[3] Como se trata de verso cantando, observe as modulações de ritmo, as diferenças entre vogais, os sons das consoantes. Veja se consegue imitar o procedimento ou se incorpora essas belezas de uma outra maneira.

[4] Entenda esta proposta da forma mais ampla possível. E boa viagem.

Exercício nº 5: traduções impossíveis
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